O ESTOPIM


“O jôgo da verdade” ─ pensei nêsta frase de Garrastazu Medici, ao ver e
ouvir representantes da Policia Federal em Mundo Novo. O “jôgo da verdade” é
coisa perigosa para os corruptos, os farsantes, os fundadores de organizações fantas-
mas com o objetivo de papar verbas.
Esses representantes da Policia Federal, esclarecidos, inteligentes, imparciais, não
são criaturas capazes de se deixarem levar por aparencias. Ouvindo os donos de
uma organização ─ fantasma e os adversários desses donos a verdade certamente terá
brilhado em seus espiritos. E o brilho da verdade é coisa importuna perigosissi-
ma, para essa gente da pseudo ─ Santa Casa que só existiu em papeis. Essa gen-
te terá dito à Policia Federal que o Hospital funcionava. Os adversários lhes terão
dito que não funcionava.
“Como funcionava?” Imagino que tenham perguntado os representantes da
Policia Federal. Não sei imaginar como terão respondido os donos da farsa. Mas
a verdade é que o funcionamento, constava de uma passagem quinzenal do Dr. Jo-
sé Modesto pelo Hospital, quando passava receitas para adeptos politicos do papa-
verbas. Outro funcionamento, este constante e não quinzenal, era a vendagem de
drogas, o comercio clandestino. Outro funcionamento: ─ os festórios com fogue-
tes, leilões e roletas e a imagem de Nossa Senhora das Candeias, para cima e para
baixo, com beatas cantando ladainhas. Era assim que funcionava o Hospital Mu-
lheres pobres morriam de parto nas roças visinhas; crianças e adultos indigentes mor-
riam a míngua porque não havia funcionamento de Hospital, não havia assistência
hospitalar em Mundo Novo.
E este estado de “criminoso abandono” do Hospital desertava crescente des-
contentamento do povo que derrotou o farsante nas eleições de 15 de novembro de
1966, na esperança de que, derrotado o papa-verbas, o Hospital e outros benefícios
públicos podessem funcionar. Vendo que o “criminoso abandono” do Hospital
continuava, muitos apelavam para o Prefeito pedindo providências no sentido de con-
seguir o funcionamento do Hospital. O Prefeito apelava para Honorato Viana. Ho-
norato apelava par alguem ou não apelava para ninguem. E os dias se passavam
sem que o atendimento aos apêlos do povo viesse. E eis que um dia correu a no-
ticia de que o Juiz de Direito, Dr. Teodolino Pereira Rodrigues afirmara, em presença
do Prefeito Ederval Neri, do Dr. Dilton Jacobina, do Promotor, Dr. Edmundo Miner-
vino e do Deputado Honorato Viana, que lamentava o fato de o Hospital de Mundo
Novo estar “CRIMINOSAMENTE ABANDONADO”.
Esta noticia correndo de boca em boca no seio do povo sofrido, descontente,
desesperado, foi o estopim que fez o incêndio! O incêndio que destruiu a farsa e
salvou a saude pública desta terra. Se a tomada, pelo povo, do edifício do Hospi-
tal, foi um ato de violência, é incontestável que foi violência em legitma defesa.
E violência em legitima defesa nunca foi crime. Lamentável que o Dr. Teodolino
não tenha querido compreender isto. Mas, graças a Deus, o extraordinário Gover-
nador Luiz Viana filho compreendeu. Compreendeu e agiu, corajosamente, fazen-
do “o jôgo da verdade” em defesa da saude publica deste municipio e municípios vi-
sinhos.
O povo de Mundo Novo, agradecido pele a Deus, de todo o coração, todas as
bençãos do Céu para o grande Governador da grande Bahia.
Deus lhe pague. Dr. Luiz Viana Filho!
MUNDO NOVO – 31 de Janeiro de 1970.

EULÁLIO MOTTA.
A folha mede 165 milímetros de largura por 235 milímetros de altura. O papel é de baixa gramatura e alta lisura. Originalmente o papel é amarelo, mas ele já se encontra escurecido. O texto foi impresso em prensa de tipos móveis. O layout é simples com poucas variações de tamanhos e tipos de letras, as linhas são longas e não há espaço especial entre parágrafos. Na tentativa de manter o texto simetricamente alinhado, o tipógrafo alongou bastante os espaços entre palavras, deixando lacunas que prejudicaram a harmonia visual do texto. O tipógrafo também utilizou aspas invertidas em diversas partes do texto. Foram preservados sete exemplares desse panfleto.